Victor Biglione

Tenho muitas revistas de guitarra; os que me conhecem podem testificar isto, o que me faz estar sempre lendo revistas novas e velhas ao mesmo tempo. Coisa de maluco, né? Pois é, o fato é que hoje eu li uma coluna escrita por Victor Biglione para a revista Guitar nº 03 (pag 73) e que vou passar na íntegra logo abaixo. Victor Biglione é um dos grandes guitarristas da música internacional que já trabalhou com Milton Nascimento, Chico Buarque, João Bosco, Steve Hackett, Lee Konitz, Manhattan Transfer, John Patitucci e com seu duo com Andy Summers, além de seu trabalho solo. Espero que te ensine algo, porque pra mim foi de grande valia. Um grande abraço e aí vai a matéria:


Alô, rapaziada!O que eu vou contar para vocês, aconteceu entre julho e agosto de 1994. eu estava trabalhando com o João Bosco. Era um trio: eu no violão de aço, Jamil Joanes no baixo e o Bosco no violão de nylon e vocais. Por sinal foi um dos trabalhos mais instigantes da minha carreira, porque você tem que ser muito hábil e experiente para não atrapalhar o maravilhoso violão do João e ao mesmo tempo contribuir, ou seja, eu nunca me metia nas levadas dele, a não ser com "pica-paus" (que é tocar percussivamente as cordas, abafando-as um pouco no cavalete) ou oitavando acordes, sempre tocando em diferentes regiões das que ele estava executando e logicamente contribuindo com solos também.

Bom, o fato é que fomos contratados para uma série de apresentações, durante a Copa de 94, na região da Califórnia. Depois disso, eu seguiria em turnê, começando pelo Canadá, com um quinteto formado por Maguinho Alcântara (bateria), Jorge Helder (baixo), Jovino Santos (piano), Jean Pierre Zanela (sax) e eu. Por sinal, nos apresentamos em vários festivais e fizemos uma apresentação histórica no Blue Note de N. York, onde estavam amigos como Eumir Deodato, Leo Gandelman e Ed Motta, entre outros.

Voltando à primeira parte da excursão (João Bosco), ainda em LA, estava tudo ótimo. Estávamos hospedados no Marriott de Century City. Embora os americanos não estivessem nem aí, eu estava contente em poder tocar boa música brasileira para eles e também envolvido com a Copa, afinal tenho dois países para torcer: Brasil e Argentina (os melhores!).

Descansando no quarto, ainda triste com o que aconteceu com o Maradona, recebi um telefonema do baterista Téo Lima convidando-me para gravar com a Dionne Warwick uma faixa para um CD. Fiquei muito honrado e feliz.

Tranqüilo pela experiência adquirida em anos de sessões dos mais diversos estilos, cheguei ao estúdio, cujo nome atual não me recordo, mas que é o antigo estúdio da Motown. Todo mundo daquela época gravou ali. A música era do Burt Bacharach, belíssima, no estilo de "Walk On By", repetindo a dobradinha que sempre deu certo com a Dionne. Primeiro o Jamil, também convidado, colocou o baixo e em seguida me chamaram para colocar a guitarra. Eu estava com a minha HB-35 da Washburn, uma versátil e ótima guitarra do tipo da Gibson 335. Observei a "harmona" e comecei a colocar detalhes do tipo: em um E com sétima maior e nona, você toca F sustenido e B na 2ª e 1ª corda, respectivamente, ao mesmo tempo, faz um "gliss" um tom acima e volta. Terças também são uma boa: em um A com sétima maior e nona ou F sustenido com sétima menor, você usa G# e B, na 2ª e 1ª corda também. Além de efeitos com volume, pica-paus e arpejos, sempre tendo cuidado com a região (freqüência) do teclado.

Enfim, fiz tudo certo, mas o fato é que ela me olhou e disse: "Desculpe Victor, mas eu não consigo ouvir guitarra nesta música! não é por você, mas eu não ouço". Aí eu falei: "Puxa Dionne, logo com você e uma música linda do Bacharach, aqui em Los Angeles, tudo maravilhoso e você não escuta guitarra?".

O fato é que tive que aceitar aquilo e posso lhes dizer que são coisas que acontecem, embora desagradáveis. Tempos depois, ouvi o CD aqui no Brasil e, pude constatar, que realmente não cabia guitarra naquela música! Gravei diversas vezes depois, tranqüilamente, tem dado tudo certo, mas sem esquecer esta passagem cheia de "glamour". Até a próxima!

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